sexta-feira, 28 de outubro de 2011

É POSSÍVEL SER ADVOGADO E CRENTE?


 Entrevista com David Teixeira de Azevedo


Alguns pensam, de forma preconceituosa, que advocacia e cristianismo
não podem andar juntos e que, ao procurarmos um advogado, estamos
 em busca de auxílio para burlar a lei. Exatamente sobre isto o vice-
presidente do Instituto dos Juristas Cristãos do Brasil afirma: “o advogado
é alguém que faz cumprir a lei”.
Nosso entrevistado é o Dr. David Teixeira de Azevedo, um dos mais
talentosos e respeitados advogados do Brasil. Possui graduação em
Ciências Jurídicas e Sociais, mestrado e doutorado em Direito pela
Universidade de São Paulo e especialização em Direito Penal Econômico
 e Europeu pela Universidade de Coimbra – Portugal.
Atualmente é professor da Faculdade de Direito da USP, vice-presidente
 do Instituto dos Juristas Cristãos do Brasil – IJCB e atende em escritório
 profissional em São Paulo. É autor de diversos livros, dentre os quais,
 Atualidades no Direito e Processo Penal, pela Editora Método.

É possível ser um crente fiel a Deus e viver da advocacia no Brasil?
David - Claro que sim. A advocacia não traz nenhuma
incompatibilidade com os princípios cristãos. Mais, a
 advocacia não é conflitante de nenhum modo com a
 fidelidade ao Senhor. Deve o advogado exercer sua
atividade profissional com todo o tirocínio e
competência, estabelecendo uma relação de empatia
com o cliente, fazendo suas as angústias e ansiedades
deste, sem, contudo, perder a capacidade de
posicionar-se estrategicamente na causa, medir os
melhores argumentos, avaliar equidistantemente os
elementos de prova então existentes. Paixão pela causa
entregue à sua responsabilidade, empatia com o cliente,
 capacidade de raciocínio técnico e exercício da profissão segundo um reto e
 por isso ético juízo, tudo isto compõe os ingredientes para um exercício
profissional conciliado com a fé e com os valores cristãos.

O que é mais difícil para um cristão no exercício da advocacia?
David - É estabelecer linha fronteiriça entre a verdade e o exercício do
direito de defesa. Devem caminhar juntos, inseparáveis. Mas que verdade?
A verdade histórica tal qual reproduzida na investigação preliminar e no
 processo.

Haveria alguma especialidade do direito na qual o advogado crente 
enfrentaria mais causas que vão de encontro ao Evangelho?
David - O terreno é igualmente espinhoso em todas as áreas. Porém,
no âmbito da recuperação judicial e no âmbito criminal as questões são
mais sensíveis.

Há um pensamento corrente de que ao procurar um advogado 
procuramos alguém para burlar a lei. 
O que o senhor pensa sobre isso?
David - É um pensamento absolutamente preconceituoso. O advogado não
 é aquele que burla a lei, mas sim alguém que faz cumprir a lei. Devemos
 lembrar que a experiência jurídica é o resultado da tríade fato, valor e
norma, como expôs o pensamento de um dos mais extraordinários juristas
do século passado e início deste, Prof. Miguel Reale. O direito vai além da
norma jurídica, que é provisória e está sujeita à alteração constante, em
razão da mudança dos valores que lhe deram significado e em virtude dos
 nossos fatos sociais. Cabe ao advogado, buscar a razão última da norma,
identificar o valor que a empolga, perceber com sensibilidade as mudanças
sociais que justificam uma releitura ou mudança da norma. Dentro desse
 trabalho é que se pleiteará o melhor direito, que inclusive pode estar
 escondido por detrás da lei.

Aumentou muito o número de igrejas que têm contratado um 
advogado para defendê-las em várias áreas. Como deve agir o 
advogado quando é contratado e sabe que a igreja agiu 
incorretamente?
David - Em primeiro lugar, o advogado não está vinculado somente às
 causas boas. O advogado tem o compromisso de bem defender seu cliente,
 extraindo da norma e do universo jurídico a que ela pertence a melhor e
mais adequada disciplina jurídica para seu cliente.
 Se a igreja errou, o trabalho do advogado é de grande responsabilidade no
que se refere à advocacia consultiva.
 Deve indicar os meios e modos jurídicos de adequar o funcionamento da
 igreja aos preceitos legais. A defesa em juízo deve dirigir-se a mostrar, se
for este o caso, como o direito - e não necessariamente uma norma jurídica
isolada - pode guardar os interesses da igreja e, assim, apontar
conclusivamente pela ilegalidade da atuação do poder público.

Temos também lido sobre líderes e pastores que não assumem 
seus erros e colocam-se acima da lei. Que conselhos o irmão daria 
para estes irmãos?
David - É o conselho de Pedro de estarmos sujeitos, e exemplarmente, a
toda autoridade humana (I Pe. 2:13). Esses pastores e líderes saibam que
"a ira do homem não opera a justiça de Deus” (Tiago 1:20) e que os
tribunais estão para corrigir com a vara quem não se conduz debaixo
da Graça.

E para os vários advogados crentes que freqüentam as igrejas 
brasileiras? Que recomendação o senhor daria para que também 
dêem bom testemunho como profissionais?
David - Uma das melhores e mais ricas imagens bíblicas é a do advogado,
em especial quando Jesus Cristo é comparado a um advogado junto ao Pai,
ou seja, o Parakletos: I João 2:1 “Meus filhinhos, estas coisas vos escrevo,
para que não pequeis; mas, se alguém pecar, temos um Advogado para
com o Pai, Jesus Cristo, o Justo.” Nosso ministério como ministros do direito,
e não meramente operadores técnicos dele, é estar ao lado de quem sofre
a injustiça, a violência, quem tem seu direito afligido. A dignidade da
advocacia, como serviço essencial à Administração da Justiça, entendida
como materialmente justa, recebeu grafia no texto constitucional e
devemos com toda autoridade e desassombro exercer nossa profissão de
modo a contribuir para que a sociedade seja mais justa, que o direito seja
efetivamente dado na exata medida em que ele pertencer a cada membro
da comunhão social. E mais, devemos aproveitar esta oportunidade para
testemunhar que nosso Deus é quem faz justiça, que se põe como Juiz dos
juízes, interpretando as circunstâncias por vezes aflitiva e adversa como o
caminho escolhido, pela soberania de Deus, para trabalhar
com o coração do homem.

Reprodução Autorizada desde que mantida a integridade dos textos,
 mencionado o site www.institutojetro.com

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